Buscar soluções para ameaças ambientais, que colocam em risco a sobrevivência da espécie humana na Terra, está na ordem do dia bem como também na esfera dos negócios. Afinal, diante de recursos naturais finitos e emergências climáticas, encontrar formas sustentáveis de produção, comercialização e circulação de bens e mercadorias actualmente é algo absolutamente necessário.
É tendo em conta nessa perspectiva que ganham atenção as chamadas greentechs, startups focadas em sustentabilidade. O objectivo desses projectos tecnológicos é desenvolver soluções inovadoras para que a transformação produtiva aconteça de forma eficiente e economicamente atrativa, ou seja, positiva para o planeta e também para os negócios.
As Greentechs, ou startups verdes, não atuam em um segmento específico, muito pelo contrário! Onde houver oportunidade de usar tecnologias como inteligência artificial ou outras para otimizar processos e reduzir impactos ambientais, haverá sempre espaço para elas. Da melhora de processos agrícolas ao transporte urbano, passando por sistemas de produção de energia ou gestão de lixo, por exemplo.
Trata-se de um mercado em franca expansão que, segundo relatório da Allied Market Research, estava estimado em 6,85 bilhões de dólares em 2018 e deve saltar para US$ 44,61 bilhões em 2026.
E no ecossistema de empreendedorismo digital nacional há uma “startups verde” que desde 2019 tem dados relance com o seu sistema de negócio inovador e promissor, numa aérea em que o nosso país deve melhorar no seu todo. Falamos da Angowaste, que se apresenta como uma plataforma que conecta geradores ou agregadores de resíduos com a indústria de reciclagem.
Para entendermos melhor o passado, presente e futuro que envolve a Angowaste, e que na última semana ficou em 2° lugar no Concurso Unitel Go Challenge, o Menos Fios foi conversar com Ana Quintas, Co-Founder e CEO da startup.
Logo de início, Ana Quintas começa a explicar-nos que a educação ambiental de separação de resíduos que teve causou um “impacto significativo na minha vida que me acompanhou até a fase adulta. Quando regresso a Luanda após a conclusão dos estudos universitários, senti alguma frustação por não ter onde destinar os meus resíduos separados, visto que o sistema municipal de recolha não era e ainda não é segregado“. Tendo esse problema verificado, a CEO diz que a “ideia era essencialmente encontrar uma solução que resolvesse o problema da ineficiência da gestão de resíduos, mas não teria essencialmente de ser uma solução tecnológica” mas felizmente ao seu background de Gestão e mais tarde um MBA, o que era uma ideia acabou por tornar-se um projecto, projecto esse que se tornou agora uma startup quase que instintivamente.
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Sobre o que é realmente a Angowaste, Ana Quintas diz “que é uma plataforma digital de comercialização de resíduos que conecta geradores ou agregadores de resíduos recicláveis com as empresas de reciclagem ou que utilizam resíduos recicláveis no seu processo produtivo“, e que a sua diferenciabilidade “é o facto de ser a primeira solução digital para o mercado de resíduos no país, que actualmente é ‘invisível‘ aos olhos da maioria da população e de certa forma pouco organizado.”
A organização da Angowaste não para por aí, segundo o plénio dos seu fundadores, visto que o projecto que consiste a startup controle a produção, transação e destinação de resíduos de uma forma simples, bem como cria relatórios periódicos automaticamente para cumprir com as obrigações legais e melhor gerir o seu negócio.
E sobre as questões legais, nomeadamente sobre a legislação ambiental angolana, foi um outro assunto abordado na entrevista, onde Ana Quintas diz que “o país não está mal servido“, mas que “o problema é a falta de mecanismos de controlo e de coação para os casos de incumprimento. No caso específico da gestão de resíduos é preciso que o órgão regulador consiga fazer com que os actores da cadeia de valor da reciclagem cumpram com a obtenção de licenças que os tornem aptos para a actividade. Existe, no entanto, espaço para melhorias, nomeadamente no que respeita a legislação para um mercado de resíduos por meio de uma plataforma digital. Temos aqui uma lacuna“. Na opinião da Founder, enquanto isto não se verificar, Angola vai continuar aquém do atingimento do ODs 12 – Consumo e produção responsáveis.
Ana Quintas foi ainda mais longe nos objectivos da sua startup sobre a legislação ambiental angolana, ao considerar que “a Angowaste quer posicionar-se como parceiro da Agênca Nacional de Resíduos, visto que a plataforma irá produzir Big Data e informação importante sobre o mercado de resíduos: tipo de resíduo mais transacionado, localização geográfica, preços praticados e destinação final dada aos mesmos.”
Sobre a caminhada até aqui, a Co-Founder exclama que a “Angowaste tem passado por um processo de validação de mercado apenas possível através de contacto directo com actores a operar no ramo da gestão de resíduos no país“, e que devido a “dificuldade de se obter informação pública sobre o sector, este processo tem levado algum tempo, tempo esse que também foi usado no desenvolvimento da plataforma“.
Ainda na entrevista, Ana Quintas informa que outra forma de validação do projecto tem sido com a participação de concursos, concursos esses onde a Angowaste tem procurado obter feedback do ecossistema nacional de inovação face à entrada de uma CleanTech em cena. E até agora os resultados têm sido surpreendentemente positivo, relata a empreendedora.
“O programa de aceleração na Founder Institute Luanda resulta de um prémio por termos vencido a primeira edição do Startup Weekend em Angola. Vencemos também recentemente a primeira edição nacional do Climate Lauchpad, o maior concurso de startups “verdes” do mundo e após as semi-regionais africanas conseguimos garantir um lugar no evento global do concurso, a decorrer no final do mês de Outubro de 2021. E por fim, ter ficado entre as as três startups premiadas no concurso Unitel Go Challence, a maior competição angolana de negócios digitais, faz-nos crer ainda mais na necessidade de uma solução como a nossa no mercado“.
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Sobre o facto de muitos rotularem a Angowaste como uma startup diferente, em relação ao que muitos estão habituados a ver no nosso ecossistema de empreendedorismo digital, Ana Quintas diz que a “grande diferença está no facto de se tratar de uma startup “verde”, ou uma “CleanTech”, ao que até ao momento não temos exemplo de destaque no nosso ecossistema de inovação. Além disso, resolve um dos maiores problemas que afecta a população urbana no país – a gestão de resíduos ineficiente. E tudo isto por meio de um modelo de negócio, ou seja, com rentabilidade financeira” salienta.
Por fim, acrescenta que a finalidade é dinamizar a economia circular nacional, criar postos de trabalho dentro da cadeia valor da reciclagem, estimular o empreendedorismo (criação de negócios de agregação de resíduos que podem ser vendidos por meio da plataforma Angowaste), dignificar o trabalho do catador informal de resíduos estimulando a criaçao de cooperativas e contribuir para a diversificação da economia.
“Acima de tudo temos vontade de provar que é possível ter um negócio rentável, escalável e ambientalmente sustentável, visto que Angola tem um potencial de valorização de resíduos estimado em mais de 600 milhões de dólares. É algo que já está provado em outros países e não podia ser diferente dentro de portas. E sim, queremos ser pioneiros no que diz respeito a startups verdes / Cleantechs e sentimos que estamos preparados para isso.“